No final do ano passado, Joel Anastácio concluiu seus estudos no curso de Agronomia, na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Ele faz parte da etnia Kaingang da terra indígena de Mangueirinha, onde nasceu e reside atualmente.
Casado e pai de uma menina, Joel tem 33 anos e, desde criança, tem interesse pelos estudos. “É algo que sempre busquei, com o pensamento de absorver conhecimento e poder desfrutar futuramente”, diz.
Durante sua infância, o indígena estudou na própria comunidade. No Ensino Médio, resolveu ingressar no curso técnico em Agropecuária, no Colégio Agrícola Estadual do Noroeste, situado em Diamante do Norte (PR).
“Esse curso motivou para que eu continuasse os estudos na mesma área, ingressando na graduação na UEPG”, afirma Joel, acrescentando que o curso tem duração de cinco anos, na modalidade presencial e contou com uma bolsa-auxílio.
Ele informa que é o primeiro engenheiro agrônomo da comunidade indígena de Mangueirinha; e que no momento está discutindo planos de trabalho para que seja possível atuar no local.
Contudo, outros moradores já possuem curso superior, como por exemplo, nas áreas de Direito, Enfermagem, Assistência Social e Pedagogia. “Fico muito feliz por não ser o primeiro e nem o último a ingressar em uma universidade. Por haver outros indígenas interessados, tendo em vista a importância que os estudos têm”.
Joel enfatiza que sempre estudou em escolas públicas. “Por isso que destaco a importância de valorizarmos as escolas públicas. Temos bons profissionais, bons professores, que atuam, fazendo todo o trabalho de aprendizado conosco. Isso é muito importante”.
Preconceito
Durante sua experiência em ingressar no ensino superior, o indígena afirma “que, no início, foi bem complicado. Temos uma sociedade bastante preconceituosa, na qual estão enraizados muitos conceitos em relação aos povos indígenas, que utilizam para discriminar, inferiorizar os indígenas. Infelizmente encontramos muito isso dentro das universidades por parte dos alunos, professores e administradores. Mas, na medida do possível, a gente tenta reverter essa situação”.
Mesmo com o preconceito, Joel não se arrepende de ter cursado uma graduação. “Não me arrependo também por ter optado por Agronomia. De maneira alguma. É um curso que podem ser utilizados os conhecimentos adquiridos para contribuir com a comunidade”.
Ele ainda acrescenta: “Particularmente penso dessa forma, que, por eu estar sempre estudando em instituições públicas, tenho uma dívida com a comunidade. Não só na comunidade indígena, mas em todas as outras. Então essa dívida de alguma forma a gente tenta pagar. Fazendo projetos, planos, trabalhando para a comunidade”.
Em relação à conquista de ter concluído o ensino superior, “sempre falo que foi algo bastante dificultoso. Só nós, que passamos por todo o processo, sabemos o que enfrentamos dentro de uma sociedade não indígena. Como eu falei, bastante preconceituosa, na qual ainda estão enraizados muitos conceitos, que deveriam ser mudados. Mas infelizmente a gente ainda encontra pessoas nesse nível, nessa ignorância”.
Joel ainda diz que recomenda aos demais indígenas que ingressem numa universidade, tanto que, na medida do possível, conversa com eles sobre o assunto. “Acredito que todo o conhecimento que você adquire é um conhecimento para você e que pode utilizar para o bem da comunidade. E é isso que a gente vem fazendo, buscando dar esse ânimo, essa iniciativa aos indígenas: que realmente busquem estudar, serem bons profissionais, estar atualizados. Porque o conhecimento tem um valor imenso. Com ele, você tem o poder”.
Informações - Paloma Stélide/Diário do Sudoeste